SOBRE CONTENTAMENTO: Quando as migalhas são tesouros



Você se contenta com migalhas? Aceita de bom grado aquilo que sobra?

Certamente a resposta será não. Meu sincero desejo é que, ao acabar de ler este texto, sua resposta mude um pouco. Falarei sobre uma mulher que se deu por satisfeita, exatamente com ‘sobras’, com os ‘restos’ da parte de Cristo.

 Por gentileza, antes de continuar leia Mateus 15.21-28.

Permita-me descrever o cenário: Uma mulher Cananéia grita, desesperadamente por Jesus: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de mim! Minha filha está endemoninhada, e está sofrendo muito. Nesse grito, uma mãe movida pelo desejo de mudar a história de sua filha, revela duas visões que precisamos ter acerca de Cristo: Ele é o Filho de Davi  (reconhecer isso é vê-lo como cumprimento das promessas do Antigo Testamento); Ele é o Senhor Misericordioso. Ver Cristo como ela via é a chave para compreender sua postura no diálogo com o próprio Senhor.

Em dado momento (verso 23), a postura de alguns discípulos de Cristo chama atenção e revela que muitos deles ainda não haviam compreendido o ministério de Cristo. Eles simplesmente pediram para que Jesus ‘dispensasse’ a mulher que vinha gritando insistentemente.  A sensação que tenho, é que eles, simplesmente, não queriam ser incomodados com os gritos ‘desesperados’ de uma mulher Cananeia.

O comportamento dos discípulos lhe parece absurdo?  A grande verdade é que, alguns discípulos daquela época, não queriam ser incomodados pelos problemas e dores de quem ‘não se encaixava no seu padrão de fé’. Sabe o que é interessante? Muitos dos discípulos de hoje, especialmente os líderes, têm a mesma postura pecaminosa e insensível. Muitos não querem ‘perder tempo’ com a dor do outro, principalmente se para aliviar essas dores, for preciso carregar fardos. E em nome dessa postura egoísta e insensível, fecham os olhos para o outro e, simplesmente dispensam aqueles que carecem de cuidado, amor e direção.

 Mas Jesus, o Senhor, diferentemente de seus discípulos do passado e de agora, não abandona as ‘ovelhas perdidas’ para as quais foi enviado (verso 24). Ele não as dispensa. Cristo não se sente incomodado pelos seus gritos de socorro. É, exatamente, porque o Senhor não rejeita os que o buscam (só busca de fato o Senhor, quem pelo Espirito Santo é arrastado irresistivelmente), que temos neste texto, uma das mais belas declarações de fé da Escritura Sagrada.

Do verso 25 em diante, acontece um diálogo magnífico, são poucas, porém avassaladoras palavras. Leia-as novamente. Faça-o com atenção.

Aqui vemos uma mulher desesperada, adorando o Deus verdadeiro (ela não o adoraria, sem a compreensão de quem Ele é. Ela sabia que estava diante do Redentor). Agora, já não há o grito, não há ‘incômodo’; uma pobre mãe clama: Ajuda-me! O barulho deu lugar ao pedido manso e mais acentuadamente dependente de uma ação transformadora, por parte do Deus da Compaixão.  Mas Jesus é tão direto, que até pode parece insensível: “Não é certo tirar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos”. O Senhor fala do mesmo modo como os Judeus tratavam os cananeus.

Qualquer um de nós sentir-se-ia humilhado. Provavelmente nos encheríamos de orgulho, levantaríamos, e, talvez, movidos pela raiva esbravejássemos contra Jesus. Afinal de contas, é inadmissível ser tratada como uma cadela, logo após adorar, após pedir pela misericórdia.

 Mas é, justamente, daquela de quem não se esperava adoração, que o Senhor faz sair uma piedosa, humilde, avassaladora e dependente declaração de submissão e esperança. “Sim, Senhor, mas até os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos”.  É como se ela dissesse: “Já que o Senhor me chamou de cadela, digo que se o sou, pertenço ao Senhor. O Senhor é meu dono!” Aquela pobre mãe via um precioso tesouro nas migalhas. Ela contemplava as bênçãos advindas de Cristo, mesmo em meio às palavras aparentemente hostis do Mestre. A ‘louca’ que há poucos instantes gritava desesperadamente, revelou-se uma humilde adoradora, que estava pronta a contentar-se com as migalhas que caíssem das mãos de seu dono. Assim como os cães se alegram com o que sobra das mesas dos donos, aquela Cananeia declara-se satisfeita com as ‘sobras’ da compaixão de Cristo.

Ela foi atendida em seu pedido. Sua filha foi curada, mais que isso, olhando o diálogo e possível crer que, aquela a quem os discípulos queriam afastar, gozou da preciosa salvação em Cristo.

 A grande lição que a Cananeia deixa para mim e para você, querido leitor, é a do contentamento, resultante da convicção de quem é Jesus. Ela nos ensina a ver os ‘tesouros nas migalhas’ de Cristo. A mulher que gritava, desesperadamente nos ensina que a fé em Cristo humilha e abate o espírito egoísta. A mãe angustiada pela dor da sua filha sabia muito bem a quem estava buscando. Tinha total convicção de que, diferentemente dos seus discípulos, Jesus não se sentiria incomodado. Ela sabia a quem estava recorrendo.

 Em tempos tão ensimesmados, em dias nos quais, até mesmo a Igreja do Senhor, é conduzida por caminhos do falso prazer, da pseudo alegria, de um contentamento verdadeiramente descontente, baseados exclusivamente numa relação com um ‘deus’ que é adorado pelo que pode proporcionar ao adorador, a mulher Cananeia ensina piedosamente sobre o precioso privilégio do contentamento real. Ao se derramar diante d’Aquele que é a razão da verdadeira felicidade, ela dá uma enorme lição: De Cristo, migalhas são tesouros. Sempre serão!

 Essa mulher evidencia que a fé autêntica, em tempo algum exalta o homem, ao contrário, ela humilha-o, faz com que ele entenda sobre ser propriedade de Cristo. Crer em Cristo nos fará ter a plena convicção acerca da nossa pequenez, de tal forma, que jamais ousaremos exigir d’Ele, qualquer bem, por mais justa que a tal exigência possa parecer.

 Que a fé em Jesus faça com que entendamos que Ele é o Senhor de todas as coisas e que nós somos inteiramente dependentes da bondade d’Ele.


Um abraço afetuoso!

 

Rev. Ricardo Jorge Pereira
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