Há alguns anos, depois de ter passado por um processo de
amadurecimento teológico, pastoral e de vida, escrevi o texto que você passa a
ler. Amigos e leitores que já leram-no anteriormente, se identificaram com o
que está escrito, se viram como num espelho, outros talvez tenham rechaçado o
que foi posto, pois discordam veementemente de minhas palavras.
Independente de como você leu antes, quero lhe convidar a ler
mais uma vez. Se você discordou veementemente, disponha-se a olhar
com misericórdia para o ‘outro’. Se você se viu no texto, desejo que olhe
atentamente para algumas ponderações que quero fazer sobre o ‘ser, mas não
estar’. É especialmente para você que reescrevo esse texto. O faço com o
coração cheio de paz, a paz do suave recomeço, a paz de um pecador que esteve
errante, mas foi pego ‘pela mão’ misericordiosa do Redentor, do Supremo Pastor
e por Ele foi reconduzido ‘estar’, pois nunca havia deixado de
‘ser’. Leia com carinho...
Durante muitos anos critiquei as pessoas que se diziam cristãs,
subscreviam as doutrinas evangélicas, mas simplesmente não queriam mais
congregar. Sempre me utilizei de textos como “Não deixemos de
congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações, e tanto
mais quanto vedes que o dia se aproxima.” Hebreus 10.25. Hoje
depois de algum tempo convivendo com, e sendo mais um cristão protestante tenho
algumas ponderações sobre esse assunto.
Conheço pessoas que de fato amam ao SENHOR, testemunham de Seu amor, graça e
bondade, mas em determinado momento da caminhada resolveram tirar alguns pesos das costas. Servos que em dado instante viram que
infelizmente a religião os afastava de Deus ao invés de aproximá-los. São
ovelhas do pastoreio d’Ele, MAS foram feridas, magoadas, maltratadas e
simplesmente se viram infelizes onde deveriam ser amadas, acolhidas, cuidadas,
protegidas...
Continuo acreditando que é
preciso congregar, que a igreja enquanto instituição é falha, mas que ainda é
um ‘lugar seguro’. No entanto, preciso admitir que por muitas vezes, tem se
tornado lugar de dor, de aflição, tristeza, decepção, frustração... Isso mesmo amado, hoje embora não concorde ou ainda relute
com essa postura, eu a entendo. Sim, consigo calmamente dizer que encontro
motivos justos para “aqueles
que são, mas agora não estão”.
Não estou falando de pessoas
que se dizem cristãs, querem viver uma falsa fé e por isso não aguentam ser
Igreja. Refiro-me a pessoas que foram regeneradas, justificadas por
Cristo, que se tornaram operosas, firmes no amor ao Senhor, mas que foram tão
moídas e afligidas onde deveriam encontrar refrigério que não suportaram o peso
e precisaram “descansar das
cargas da religiosidade”. Sim, conheço pessoas assim. Gente fiel ao Senhor! Gente que O tem como Soberano.
Já vi pessoas terem o
passado remoído, a honra manchada, o nome jogado ao chão. Vi também calúnias
serem levantadas, falsos testemunhos, mentira, hipocrisia. Testemunhei pessoas
sendo postas “de lado” porque não tinham os mesmos costumes ou por terem
opiniões diferentes. Isso tudo em nome da RELIGIÃO, dos ‘bons costumes’. Vi pessoas
‘crucificadas’ porque não baixaram a cabeça para o erro, porque não se
subjugaram a decisões e posturas contrárias ao Senhor.
A fofoca, o disse-me-disse,
a falta de amor, de solidariedade, de justiça, de perdão, as promessas vazias
em pregações feitas para agradar o freguês e promover lágrimas fúteis são
instrumentos usados pelo Diabo para simplesmente afastar pessoas da Igreja. E
infelizmente preciso reconhecer que muitos líderes, muitos dos que deviam
apascentar, apenas afugentam. São lobos em peles de cordeiro e querem devorar, destruir...
O pior de tudo é que não
percebo esforços para trazer essa gente de novo para perto; é como se eles
fossem descartáveis, indesejadas, imprestáveis... Até parece que existe alívio
nos corações de muitos quando essas pessoas saem. O pastoreio perdeu-se em meio
ao ativismo, ao evangelicalismo e a imensa postura empresarial e ditatorial das
comunidades ditas cristãs. Parece-me que o pastor que vai a busca da única ovelha que
ficou pelo caminho já não existe mais. A igreja tem deixado de ser IGREJA e por
isso, perdido o seu perfil pastoral, cuidador, zeloso.
Sabem como passei a entender
esses queridos? Quando comecei a refletir como eles, quando me senti como
alguém que “é, mas não quer estar”. Adquiri nos um costume meio solitário,
mas altamente devocional. Pego o carro e saio dirigindo acompanhado unicamente
por Aquele que não me deixa em tempo algum. Nem importa para onde estou indo,
apenas com quem estou... Nesses momentos ponho meu coração, sonhos, angústias,
pecados, enfim, ponho-me diante d’Ele. Exatamente
em situações como essa reflito sobre a coisa institucionalizada demais,
burocratizada demais, medida demais, farisaica demais em que estamos
transformando a NOIVA do Cordeiro.
Um dia desses percebi que
não me encaixo nessa coisa toda. Não sou um desses supra-santos, não sou
infalível, impecável. Sou um pecador miserável, sem dignidade, sem merecimento,
sem bens... Sou um
desses que simplesmente não cabem numa igreja tão cheia de exigências
pretensamente morais.
Ah! Mas sou pastor, pensei
eu. Isso era apenas um eco do que escuto sempre que “não agrado” aos fariseus, aos “donos”, dominadores. Senti nesse momento como resposta uma paz tão doce
em meu coração ao ter em minha mente um eco da graça que me dizia: “seja ovelha, pois é apenas isso que importa”.
Hoje creio de maneira ainda
mais convicta que é preciso congregar, que é preciso crescer junto, aprender,
caminhar... É sim doce a comunhão dos remidos do Senhor. Sei que grande parte
dessa gente que parou de congregar não optou por estar fora da Igreja, apenas libertou-se de uma igreja tacanha, mesquinha, fofoqueira,
sugadora e nem um pouco pastoral. É triste constatar isso, mas infelizmente a
grande verdade é que muitos dos que “estão não são e diversos que são não estão”.
Tenho orado por uma Igreja acolhedora, amável, militante, proclamadora, piedosa, pastoral. Uma Igreja que ama o Seu Dono de tal forma, que não deseja outra coisa senão adorá-lO. E por ser assim, ela se ama. Por amar, cuida, protege, pastoreia. Essa Igreja, essa bela Noiva não exclui, ao contrário abraça e trata os feridos. Não aponta o dedo trazendo a tona o passado sujo do outro. Na verdade ela é instrumento do Senhor para restaurar as mais purulentas feridas.
Nas minhas orações, leituras
da Palavra e em conversas com homens que temem a Deus, que O amam e que desejam
honrá-lO em seus ministérios, fomos movidos pelo Pastor Supremo a entender que
é possível buscar uma comunidade onde tais posturas, sentimentos e escolhas
diárias sejam praticadas. Entendemos que é possível construir relacionamentos
dignos do Nome que carregamos em nossas almas. É possível vivenciar ainda que
de forma limitada as alegrias da verdadeira comunhão dos remidos do Senhor.
Por isso, reescrever esse
texto é mais do que simplesmente para dizer que continuo entendendo você. Sim,
continuo! E sinto-me do mesmo modo. Mas hoje meu coração está cada dia mais
instigado, movido e altamente motivado pelo desejo de contribuir para que assim
como eu e outros queridos, ‘você
esteja de volta e viva o que é e jamais deixou de ser’. Quero ser instrumento pelo
qual o Senhor lhe conduz de volta ao CAMINHO DA REDENÇÃO.
Esse texto é para dizer que
assim como eu e você, há uma ‘porrada’ de gente que ama o Senhor, que já sofreu
um monte de mazelas pelas escolhas dos outros e pelas suas próprias. Uma gente
que definitivamente não quer viver esse ‘evangelho superficial’ presente em
muitos lugares. Um povo que apesar de desejar ardentemente um evangelho
simples, relacional, amigo, pastoral, piedoso e relevante, ‘morre de medo’ de
sofrer outra vez, de se decepcionar novamente e ter a alma moída. Sim, tem uma
porção de gente que como nós, sente a mesma coisa. Essas pessoas precisam de
alguém para caminhar junto, para bater um papo enquanto come uma pizza, para
orar junto e para voltar ao CAMINHO DA REDENÇÃO.
Acho que já está na hora de você, eu e outros
que somos, buscar outros que também são e estarmos juntos caminhando na busca
por outros que ainda perceberão que são, até o dia em que de fato seremos um
com o Senhor!
Sim, eu escrevi cada palavra
dessa pensando em você. Em cada linha que reescrevi e em cada parte nova nesse
texto, minha mente vislumbrou o rosto de cada irmão, irmã, filho e filha na fé,
que o Senhor Deus me deu e que sei que apesar de ser, agora não está. Por
isso, ao ler imagine que eu estou falando diretamente para você, pois estou.
Tenho certeza que você consegue me ‘ver’ falando cada palavra dessas. Mais que
isso, você sabe que essa é uma verdade que arde em meu coração.
Meu grande desejo é que você
redescubra a alegria de estar e que esse redescobrir lhe faça desejar trilhar
com o coração repleto de alegria o CAMINHO DA REDENÇÃO.
Que o Supremo Pastor nos faça SER, mais do que
simplesmente ESTAR!
Pr. Ricardo Pereira
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