DELÍRIOS DE UM JOVEM PASTOR





Tenho pensado bastante nos últimos dias acerca do pastorado cristão. Vivo dias de inquietação, reflexão, avaliação. Por vezes me pego questionado e questionando-me sobre mim mesmo enquanto pastor do rebanho.
Tais pensamentos derivam inicialmente daquilo que ouço das pessoas sobre mim e sobre outros pastores. Minhas reflexões estão inteiramente ligadas aquilo que a “Igreja” ou as pessoas dentro ou em redor dela, esperam de um pastor; mas também são resultado das minhas próprias inquietações, frustrações, medos, seguranças e inseguranças enquanto cristão.
Quero aqui expor alguns “DELÍRIOS DE UM JOVEM PASTOR” sobre o que, em minha opinião, define o que É UM PASTOR nos moldes da Escritura. Antes precisarei dizer o que não é um pastor. Por fim direi o fim dos meus delírios. Então vamos a eles?
                DELÍRIOS DA NEGAÇÃO
1.      Nego veementemente que um pastor deva ser definido por um padrão ridicularizado de “roupas”. A igreja tem afirmado, ainda que de forma velada que pastor é medido por sua elegância, pelo paletó, pela discrição do que veste;
2.      Nego gritantemente que pastor é um ser bitolado que vive de “igreja”. As pessoas nos tratam diversas vezes como homens especiais, como seres alheios a realidade. As vezes alguns de nós acabam por gostar disso ou se travestem de santarrões. Isso é um péssimo caminho para pastores e para própria Igreja de Deus;
3.      Nego sem pestanejar, as afirmativas que nos colocam como cidadãos de primeira linha, como mais íntimos de Deus, os senhores absolutos da santidade;
4.      Nego enfaticamente que sejamos duas mazelas antagônicas: a primeira coloca os pastores como empregados da Igreja, como alguém que é pago e por isso deve atender as demandas de trabalho. A segunda nos vê como senhores do rebanho, como donos da Igreja. Ambas são duas faces da mesma moeda da perniciosa maldade;
5.      Nego loucamente a absurda e vil mentira de que pastor é um gerente de igreja;
6.      Nego quase que chorando a mentira deslavada de que todo pastor é ladrão;
7.      Nego com todas as minhas forças o papel de animador de auditório.
8.      Nego que pastor é um fiscalizador da vida dos cristãos;
9.      Por fim quero negar ainda que o pastor é uma espécie “porta estandarte” denominacional, um defensor de bandeiras eclesiásticas. Pastorado não tem nada com política eclesiástica ou com querela denominacional.
DELÍRIOS DA AFIRMAÇÃO
            Postos os meus “negos” quero dizer os meus “afirmos”. Pretendo falar aquilo que entendo biblicamente ser um pastor:
1.      Afirmo ser o pastor um pecador miserável, incapaz de crer sem a ação transformadora do Espírito Santo de Deus (Romanos 3.10, Efésios 2.1-10, etc);
2.   Afirmo ser o pastor um pecador que embora redimido, continua sendo imperfeito, frágil, miserável e carente da graça e bondade de Deus (Romanos 7);
3.      Afirmo que o pastor é um ser humano normal (ou não), frágil, limitado, com vontades, preferências...
4.   Afirmo que o pastor é alguém que chora, sorrir, ama, sente raiva, se magoa, tem carências, necessidades, medos, angustias... (Veja as cartas de Paulo e perceberá um pastor com todas as fragilidades de um ser humano qualquer)
5.    Afirmo que o pastor é alguém que vive e deve viver a realidade presente, tendo o direito de gostar de coisas, práticas, costumes e ambientes que alguns podem não gostar. Isso é um direito de todos;
6.      Afirmo que o pastor enquanto ministro de Deus é um livre escravo do Senhor servindo à Sua Igreja, não por uma compensação material, mas pelo chamado de Deus. Dizer isso não nega o direito ao sustento por parte da Igreja, apenas esclarece que a motivação não é material (1Pedro 5.1-4, 1Coríntios 9.13,14, 1Timóteo 5.17,17);
7.       Afirmo que o pastor é boca de Deus. Quando seu pastor prega a Bíblia fielmente, Deus está falando. E se você rejeita essa voz, não é o pastor que está sendo negado, mas o PASTOR (Jeremias 1.4-10, Veja as cartas Pastorais de Paulo)
8.      Afirmo que pastor é um defensor da verdade do Evangelho e que enquanto boca de Deus, deve pregar todo desígnio de Deus, doa a quem doer (Atos 20, Romanos 7 e os profetas);
9.      Afirmo que o pastor é alguém que AMA, e só quem é pastor sabe do amor que falo. Não tenho medo de dizer que pastores conseguem chegar perto de imaginar o que é ser mãe. Amamos quando não somos amados, oramos quando não nos querem orando, choramos por quem nos fez chorar, sorrimos quando entristecidos (Galátas 4.19)
10.   Afirmo que ser pastor é supra denominacional, é mais que uma honra, é mais que um privilégio, ser pastor transcende denominações. Isso tem a ver com vida, com vocação, com ordem de Deus.
11.  Afirmo que ser pastor é ser amigo (veja o amor de Paulo e sua amizade com o rebanho, veja o amor do Supremo Pastor).
CONCLUSÕES DE UM DELÍRIO
A cada dia, em meus delírios próprios dos loucos (já disse o louco Paulo que a palavra da cruz é loucura “1Corintios 1.18-25” – então, que eu seja louco) percebo que a igreja quer pastores a gosto do freguês. Quer pastores que se enquadrem no seu sistema, no seu perfil, nos seu modus vivendi... E cada igreja local quer tem um querer diferente.
Perceber isso me faz chegar a triste conclusão de que  aqueles que de fato querem ser pastores estão a cada dia mais ameaçados de sofrer com a rejeição de comunidades que querem os “pastores a gosto do freguês”. Pessoalmente não temo por isso. Não me assusta a perda do “status eclesiástico”, a falsa honra dos títulos, das cabeças meneando positivamente, das tapinhas nas costas, da glória denominacional. Não temo, pois tenho a convicção simples e firme de que um dia o Deus que me conheceu antes da fundação do mundo, me consagrou para o ministério (Efésios 1, Jeremias 1.4-10) e que o rebanho d’Ele transcende portas, paredes, muros, títulos e que onde houver rebanho haverá necessidade de pastor. Deus me fez pastor do rebanho DELE!
Por isso posso tranquilamente bradar que: Não serei um animador de auditório que diz palavras bonitinhas para agradar uma gente que a cada dia se distancia mais de Deus.  Não dominarei o rebanho ou serei um inquisidor de uns para agradar a outros.
Não tratarei a Igreja como uma empresa ou como um circo. Não vestirei a roupa de super-herói da Gospelândia pondo-me como paladino da justiça e solucionador de todas as causas.
Jamais me postarei com essa santarrice vil do meio evangélico. Jamais negarei minha podridão moral, minha pecaminosidade. Em nenhum momento me porei como alguém perfeito. Lutarei contra o que sou, mas nunca o negarei.
Não serei movido pelo meu próprio ego ou pelos desejos de pessoas que embora estejam, não são Igreja.  Não quero isso pra mim. Não serei feliz assim! Quero amar gente, cuidar de gente, buscar, pregar, brincar, abraçar, exortar.  Quero poder ir em busca das ovelhas do Senhor. Isso é o que me faz feliz.
Quero ser aquilo que Deus me quis fazer.
Sou um ninguém chamado pra cuidar de outros ninguéns!

                              

Caco,  
um pastor 

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